Prof. Ricardino Lassadier: O Pecado: uma realidade

Prof. Ricardino

O Pecado: uma realidade 

1-No curso que ministro sobre o CIC no CCFC e em outros locais uma das questões que mais aparece é acerca do pecado. Para tentar ao menos indicar uma resposta sobre o tema que é por si vastíssimo, procurei resumir um texto que originalmente é mais extenso 

2-O mundo contemporâneo, a civilização atual “não vê com bons olhos” qualquer reflexão ou doutrina que trate da questão do pecado. O motivo é simples: na mentalidade vigente busca-se negar qualquer consciência acerca da culpa, pois dessa forma instala-se uma concepção de inconsequência universal, ou seja, ninguém seria culpado. Uns dizem que todas as nossas ações têm suas origens em impulsos inconscientes, logo, não temos culpa e precisamos aprender a lidar com isso para sermos felizes. Outros dizem que nossas ações brotam de uma sociedade injusta e desigual, isto é, o homem é exclusivamente produto do meio, logo, não existem pecados pessoais, somente pecados sociais.

Mas o que está por trás da negação da consciência da culpa e do pecado? Essa resposta é igualmente simples: a negação da responsabilidade. Dizendo de outra forma, o homem desde a modernidade e mais ainda na contemporaneidade empenhou-se em negar a consciência sobre o pecado, visto que, negando o pecado, nega ao mesmo tempo a culpa; e negando a culpa, nega a responsabilidade. A Doutrina da Igreja nos ensina que a realidade do pecado é presente na história humana e que seria inútil dar outros nomes ao pecado ou mesmo ignorá-lo (cf. CIC, 386).

A Igreja crê no pecado (em sua existência), não por gostar de modo masoquista da culpa e sim por compreender, mediante a luz do Espírito, que a consciência da culpa nos faz responsáveis e nos coloca em alerta para o recebimento da salvação. Por isso, nosso pensamento deve partir e ser norteado pelo ensinamento Magisterial da Igreja, pautado na Escritura e na Tradição.    

3-A Igreja define o pecado da seguinte forma: “O pecado é uma falta contra a razão, a verdade, a reta; é uma falta ao amor verdadeiro para com Deus e para com o próximo, por causa de um apego perverso a certos bens. Fere a natureza do homem e ofende a solidariedade humana. Foi definido como ‘uma palavra, um ato, ou um desejo contrários à lei eterna” (CIC, 1849).

Se ficarmos atentos a essa definição, as palavras usadas são aquelas que expressam uma idéia de negatividade, de ausência.  O CIC usa por duas vezes a palavra falta em referência contrária à razão, a verdade, a consciência reta; assim como ao amor verdadeiro a Deus e ao próximo. Propomos uma breve consideração sobre a concepção de pecado enquanto falta.

Falta contra a razão: implica postular à ignorância, a falta de conhecimento, a obscuridade inclusive em nível intelectual.  Isso nos indica que o pecado pode eclipsar até a inteligência, o raciocínio. Basta lembrarmos quanto mal foi causado, em diversos momentos da história, por pessoas inteligentíssimas, mas que, no entanto viviam mergulhadas no pecado: Hitler, Napoleão Bonaparte dentre outros.        

Falta contra a verdade: é a afirmação da mentira, do engano, é a proclamação da ilusão que se dirige à inexistência, é a negação da criação e do criador. É, então, algo abominável, fonte de heresias e apostasias.

Falta contra a consciência: é o estabelecimento da inconsciência ou da falta de ciência das coisas de Deus. Sendo a consciência o “local” da intimidade entre o homem e Deus, afirmar a inconsciência é requerer a impossibilidade da relação entre homem e Deus, entre criatura e Criador, entre imagem e representado. 

O CIC também indica que o pecado constitui-se como uma dupla falta contra o amor em dois sentidos: para com Deus e para com o próximo.

Falta do amor para com Deus: é a perversão do amor que sugere um “amor” egolátrico, que se fecha em si mesmo e é incapaz de ver Deus como ele é, mas ao contrario, é o desejo que imagina um deus que é imagem e semelhança do homem.

Falta de amor para com o próximo: está ligado a falta anterior. Este aspecto do pecado é a fonte da incapacidade de enxergar o homem em sua dignidade de pessoa, mas ao contrário, vê o próximo como um objeto destituído de existência própria. O próximo só existe mediante a utilidade que tem ou pode oferecer. O CIC também afirma que o pecado fere a natureza e ofende a solidariedade. A ferida produzida pelo pecado mostra-se na impossibilidade de compor uma relação sadia, assim como no estabelecimento de uma concepção corrupta e agressiva acerca da humanidade e sua natureza. Em uma palavra: perversão.

O pecado, ainda segundo o CIC, é um desejo ou um ato contrário a Lei Eterna. Ou seja, é desejar o que é oposto a Vontade de Deus, aos seus Mandamentos, aos preceitos propostos e indicados por sua Igreja. É um apego a efemeridade, a contingencialidade, ao prazer volúvel, inconstante.  É apegar-se a si e fechar-se a Deus; por isso o pecado entristece, ofende a Deus (CIC, 1850).

Mente, portanto, todo aquele que diz amar a Deus, mas não se empenha em converter-se, em melhorar, em não pecar, em crescer na santificação.


Ricardino Lassadier Rodrigues de Sousa é Professor, Graduado (Bacharel e Licenciado em Filosofia), Especialista em Filosofia (Epistemologia das Ciências Humanas), Especialista em Teologia (Teologia e Realidade com ênfase em Bioética). Colaborador do CCFC desde 2006.